Hoje, começam as aulas aqui na Universidade do Minho. No que à Fisiologia diz respeito, os futuros médicos vão suar com a aprendizagem meticulosa dos sistemas cardiovascular e respiratório. Numas pesquisas que andava a fazer na internet médica, deparo-me com este artigo: «The efficacy of stethoscope placement when not in use: traditional versus “cool”». A questão que intrigava os autores desta investigação era se a moda cool de pendurar o estetoscópio ao pescoço desleixadamente e na transversal traria alguma vantagem sobre a forma clássica de o prender com as olivas (a porção auricular) à volta ao pescoço. As fotografias exemplificativas (à direita, o cool; à esquerda, o tradicional) foram retiradas do artigo. A forma como cada um dos médicos usa o boné não é inocente.
Para os autores, a forma tradicional pareceria ter uma vantagem óbvia, que é o facto do reposicionamento do estetoscópio nos ouvidos apartir da ‘posição de repouso’ clássica poder ser feita com uma só mão, possibilitando que a outra mão fique livre para (e cito os próprios autores) «afastar ou sentar um doente desobdiente.» Partindo disto, foram estudar qual das formas de pendurar o estetoscópio é mais eficiente, isto é, qual delas permite o reposicionamento na posição de auscultação mais rapidamente.
Recrutaram 200 médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde que usassem (ou tivessem usado no passado) estetoscópio: 100 para cada grupo. Os cirurgiões foram excluídos, por (e, mais uma vez cito os autores) «a maioria não encontrou o velho estetoscópio dos tempos de escola» (enfiei o barrete :)). Para comporem o grupo clássico tiveram que recorrer a muitos lares de idosos, pelo que a diferença de idades entre os dois grupos era notória. A média de idades no grupo dos clássicos era 67,4 anos, enquanto no grupo cool a média era 38,7 anos. Ainda assim, os ‘clássicos’ foram mais rápidos no reposicionamento do estetoscópio para a posição de auscultação. A média de tempo entre a posição de repouso e de auscultação foi de 1,9 segundos no grupo dos clássicos. Já o grupo cool demorou em média 3,2 segundos . A diferença de médias foi de 1,3 segundos e teria significado estatístico…
…e económico. Os autores estimam que a moda de usar o estetoscópio à cool, no universo dos profissionais de saúde do Canadá pode significar uma despesa de 256750 segundos (71,32 horas) por reposicioniamento do estetoscópio, por pessoa, por ano. Assumindo que 80% dos profissionais aderiram à moda cool e que cada um deles usa o estetoscópio 20 vezes por dia, poderemos estar a falar de 273869 horas de tempo desperdiçado, o que ao preço/hora practicado no Canadá em 2000 (data do estudo), se pode traduzir em 20,5 milhões de dolares deitados ao lixo.
Obviamente, este artigo tem um lado lúdico forte, mas a componente científica está lá. Os autores autores são William Hanley, Professor Emérito e Médico Honorário do Departamento de Pediatria da Universidade de Toronto, e Anthony Hanley, Professor Auxiliar de Epidemiologia e de Nutrição da mesma universidade. Desconheço o grau de parentesco destes Hanley, mas imagino uma galhofa familiar à volta de uns copos depois de um almoço de Domingo alegre e bem disposto. Leiam como acaba o artigo (negrito meu):
Acknowledgements: We were unable to obtain funding for our study from any respectable granting agency. The participating volunteers and the research assistants were, however, rewarded (after the testing) with a shot (90 mL) of 12-year-old Cardhu Single Malt Scotch Whisky (Cardhu Distillery, Knockando, Moray, Scotland) (traditional group) or a pint (568 mL) of Sleeman Honey Brown Lager (Sleeman Brewing and Malting Co., Guelph, Ont.) (cool group). We thank the distillery and brewery for their significant contributions to this important research. After all, the idea for this project was formulated one Sunday evening after having ingested a quantity of the above-mentioned libations. It all seemed like such a good idea at the time.
Competing interests: None. The authors are equally fond of several other brands of single malt Scotch and beer (see Acknowledgements).
Deveríamos fazer mais ciência desta.