A DGS, depois de ouvir «um grupo de especialistas em Pediatria e Saúde Infantil, bem como de membros consultivos da Comissão Técnica da Vacina contra a COVID-19» recomendou a vacinação das crianças entre os 5 e os 11 anos. Lamento que algumas declarações de colegas médicos tenham criado dúvidas nos pais. A certa altura, como pai, fiquei na dúvida se deveria ou não vacinar os meus filhos. São dúvidas legítimas e que vou tentar esclarecer ponto a ponto, aproveitando para partilhar porque pretendo vacinar os meus filhos.
Primeiro, a vacina é segura. Este ponto ninguém (credível, pelo menos) contestou. Os resultados dos ensaios clínicos estão públicos e disponíveis aqui e a monitorização feita pelas agências do medicamento europeia e americana não têm recebido alertas de reações adversas inesperadas. Tenho lido algumas preocupações desde o início da vacinação (antes de se falar da vacinação das crianças) sobre eventuais efeitos laterais a longo prazo. De facto, as vacinas de RNA são novas, mas não se especula atualmente que possam ser nocivas daqui a meses ou anos. Esta tecnologia foi investigada em vários laboratórios de diferentes países, os resultados são partilhados em reuniões e revistas científicas credíveis. Alguns efeitos laterais que têm aparecido são escrutinados publicamente e o risco-benefício de vacinar é monitorizado continuamente. Acreditar que existe uma conspiração planetária para encobrir resultados nocivos é não ter ideia como hoje se faz ciência.
Segundo, a vacina é eficaz na diminuição da transmissão entre as crianças e entre crianças-adultos. Outro ponto que ninguém (credível, uma vez mais) parece contestar. Isto é especialmente importante para quem vive ou convive com familiares, colegas da escola ou amigos com co-morbilidades em que a infeção por SARS-Cov-2 possa significar uma infecção grave ou mesmo a morte. Este sentido de pertença a uma comunidade que pretendemos proteger, para mim, bastaria como argumento a favor da vacinação, mas há mais.
Terceiro, a vacina é eficaz na diminuição da doença grave. De facto, até agora, a percentagem de doença grave na criança tem sido muito baixa. Em termos absolutos, muito poucas crianças precisaram de cuidados intensivos em Portugal (4 a 10, pelas fontes que ouvi na RTP1). Mas estes dados reportam a períodos em que poucas crianças eram infectadas, enquanto atualmente as principais vias de infecção ocorrem exatamente nesta faixa etária. À medida que forem crescendo o número de infectados, maior será o número de crianças que poderão precisar de internamentos hospitalares e cuidados intensivos. Pode até acontecer que a própria proporção de doentes graves versus doentes ligeiros aumente. Isto pode acontecer por uma alteração do próprio vírus (e não têm sido poucas), por haver mais crianças com mais comorbilidades do que imaginamos, e por mil e uma razões pelas quais esta pandemia insiste em atormentar a nossa vida. Nos adolescentes vacinados nota-se já uma diminuição significativa do número de miocardites desde a vacinação e tudo indica que venham a existir menos Síndromes Inflamatórios Multissistémicos. Nos adultos, as consequências a médio e longo prazo das infeções (mesmo das ligeiras) têm sido bastante inesperadas e, nalguns casos, bem incapacitantes. Pode vir a acontecer o mesmo nas crianças ou não, mas agora temos uma forma segura de prevenir.
Finalmente, o isolamento social a que temos sujeitado as nossas crianças é psicologicamente muito pior do que qualquer picada no braço. Nalguns casos, o isolamento escolar coloca-as em risco alimentar ou mesmo de integridade física. As consequências a longo prazo destes isolamentos consecutivos para o seu desenvolvimento são reais e já se fazem sentir. Sei que este isolamento não depende só da vacinação, mas ainda assim depende grande parte dela.
Estes são os meus argumentos. Longe de mim desrespeitar quem pensa ou pesa as suas decisões de forma diferente da minha. Como disse acima, as dúvidas são legítimas e as declarações de alguns médicos vieram aumentar a confusão. A decisão de vacinação é individual e livre. A obrigatoriedade da vacina já se discute noutros países europeus, mas isso é uma discussão ainda mais difícil.
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