Preparar a criança (e os pais) para uma cirurgia

A forma como uma criança acorda da anestesia depende muito da forma como adormeceu. Julgo que todos os pais já tiveram a experiência de uma criança que adormece a chorar, aborrecida com alguma coisa ou (mesmo sem ser a chorar) agarrada a um brinquedo. A primeira coisa que essa criança faz quando acorda é perguntar pelo brinquedo ou mesmo continuar a birra em que estava. O mesmo se procede com a indução anestésica. Se a criança adormece agitada, assustada com o que lhe está a acontecer, é muito provável que acorde da mesma forma, a chorar, a espernear, a bater em tudo à sua volta. Assim, é muito importante que os pais preparem a criança para o que vai acontecer no dia da cirurgia. Um conjunto de dicas (ou serão mais regras?) para tornar a cirurgia menos traumatizante.

Primeira dica (neste caso, uma advertência), NUNCA mentir aos filhos. Uma coisa é fantasiar à volta do que vai acontecer – exemplo: vão te colocar uma pomada mágica nas mãos para não sentires a borboleta a picar. Outra coisa é mentir – exemplo: vens ali com o pai que eu é que vou ser operado. Imagine-se a ser despido numa sala cheia de monitores, luzinhas e alarmes a apitar por todo lado e ser levado por 2 ou 3 adultos de pijama. Imagine que a única pessoa com quem poderíamos contar lhe mentiu, atraiçoou-o e entrega-o para a mão destes desconhecidos. É o pânico. Mentir é feio. (Não é isso que ensina às crianças?)

[fonte: twitter.com/mghfc] 

Segunda dica, crie um ambiente tranquilo e seguro para a criança. As crianças são colaborantes com os profissionais de saúde desde que se sintam seguros. É importante os pais estarem confiantes e não transparecer o nervosismo. A melhor forma de o fazer é esclarecendo todas as dúvidas previamente com o cirurgião e com o anestesista. A maioria dos mitos criados à volta da anestesia geram ansiedade escusada aos pais. Lembre-se que os pais são o ‘porto de abrigo’ dos filhos e, saber que podem contar com eles tranquiliza-os. Se os pais estão preparados para o que vai acontecer, podem até entrar na sala de operações e assistir à indução anestésica. Se os pais não são capazes (e não é vergonha nenhuma não o ser) ou o bloco operatório em questão não está preparado para essa dinâmica, a criança que se sente em segurança não se importa de ‘ir ali ao lado e voltar num instante’. Ainda no tema da confiança que se procura transmitir à criança, levar um boneco ou qualquer outro objecto de ligação/transição (aqui se incluem as chupetas) ajuda.

Terceiro, explique com antecedência. Dependendo da idade, mas sobretudo da maturidade de cada criança, é bom ir explicando nos dias anteriores o que vai acontecer: que vai haver luzes esquisitas, alarmes inesperados, gente vestida com pijamas esquisitos,  etc. Não ser apanhado de surpresa no próprio dia, ajuda a não cair nos erros explicados no ponto um e ponto 2. Quem melhor que os pais para adaptarem a informação e a linguagem ao perfil dos seus filhos? Pode fazer teatrinhos com os ursos de peluche, pode fazer programas para fazerem juntos assim que saírem do hospital, podem ver vídeos na internet…  Nesse sentido, parece-me bastante útil o vídeo que se segue do clube de anestesia regional (autoria de Rita Lopes).

Quarto, prepare a malinha com o seu filho. O pijama deverá ser fácil de vestir/despir. Preferir 100% algodão, pois as fibras poderão interferir com alguns dos aparelhos. Mas o mais importante é a criança achar-se bonita com ele. Não esquecer a escova de dentes e outros acessórios da higiene diária, principalmente se ficar internado. Deixe-o escolher um ou dois brinquedo.

Quinto, não esquecer do tempo de jejum. O jejum é fundamental para a anestesia decorrer de forma segura. Se o cirurgião não disse qual o tempo de jejum que quer, fique a saber que genericamente o tempo de jejum necessário após a ingestão de uma refeição por mais leve que seja, sólida ou líquida (o que inclui o leite de farmácia) são 6 horas; de leite materno são 4 horas. A criança pode beber líquidos translúcidos (água, chá com açúcar) em pequenas quantidade até 2 horas antes.

Sexto, trate atempadamente das burocracias. Informe-se atempadamente na escola e no seu emprego, que tipo de declaração, atestado, baixa e/ou certificado será necessário para o pós-operatório.  No dia da cirurgia não se esqueça de o pedir ao cirurgião ou alguém da equipa, porque, no stress do acontecimento, às vezes os ‘papéis’ ficam esquecidos.

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O meu bebé está irritado – será uma hérnia inguinal?

As hérnias inguinais são muito frequentes na criança e podem ser uma causa grave de dor e irritação no lactente. Por isso, não é só para ver se a fralda está suja que os pediatras e os médicos de família recomendam abrir a fralda dos bebés irritados. As hérnias inguinais são muito fáceis de detectar, porque ​qualquer pai ou Mãe identifica um ‘papo’ a mais na virilha do seu menino ou da sua menina.

Mas o que é uma hérnia inguinal?

Mas deixem-me recuar um bocadinho até ao feto. Os testículos nascem dentro da barriga do feto e vão descendo até encontrar o seu lugar no escroto. O canal por onde desce chama-se canal peritóneo-vaginal e pode persistir aberto por muitos meses, após o nascimento do bebé. Se o canal permitir a passagem de liquido intra-abdominal, estamos perante um​ hidrocelo (comunicante​). Se o canal permitir a passagem de uma porção de intestino ou gordura, estamos perante uma​ hérnia inguinal.

Como se trata?

O tratamento do hidrocelo comunicante e da hérnia do lactente e da criança é o mesmo e consiste na laqueação (isto é, encerramento) do tal canal peritoneo-vaginal cirurgicamente. No entanto, os tempos para cirurgia diferem. ​A hérnia inguinal deve ser operada o mais brevemente possível, porque tem risco de encarcerar. Ou seja, o intestino pode prender no escroto impedindo que ele volte para dentro. Para além de dor intensa, o bebé desenvolverá um quadro oclusivo, porque o conteúdo intestinal deixa de progredir apartir daquele ponto. Começam os vómitos e a deterioração do estado geral é muito rápida. Se houver encarceramento, deve levar o bebé imediatamente a um serviço de urgência.

Enquanto aguardam pela cirurgia, os pais devem ser instruidos sobre a manobra de redução da hérnia inguinal e os sinais de encarceramento.

O hidrocelo comunicante raramente evolui para hérnia e, muito menos, para hérnia encarcerada. Nesse sentido, ​pode-se esperar para ver se existe resolução espontânea do hidrocelo​. Na Europa e nos EUA convencionou-se esperar até aos 2 anos, altura apartir da qual se acredita que já poucos canais fecharão por si.

Na menina​, a hérnia resulta da persistência do canal de Nuck, uma estrutura homóloga ao canal peritoneo-vaginal dos meninos. Mais do que o intestino, estas hérnias são muitas vezes local de encarceramento do ovário. Por isso, têm também​ indicação cirúrgica assim que forem diagnosticadas.​ Mais uma vez, não é urgente, mas deve ser agendada para os meses seguintes.

Vantagens da cirurgia laparoscópica (sem cicatriz)

Como expliquei, o tratamento das hérnias inguinais é sempre cirúrgico. Nos últimos anos, tem havido uma tendência maior para a​ correção laparoscópica. ​A laparoscopia consiste na introdução de uma câmara de vídeo pelo umbigo e instrumentos que perfuram a pele, sem ser necessário abrir uma ferida cirúrgica propriamente dita. Logo, e para ser completamente honesto, existem cicatrizes sim, mas elas são invisíveis. Uma vez que a única ‘abertura’ é feita pelo umbigo (a nossa cicatriz natural), as vantagens estéticas são evidentes.

À esquerda, cicatrizes inguinais da correção de hérnias inguinais bilateralmente pela via clássica/aberto; à direita, a mesma cirurgia por via laparoscópica.

Mas a maior vantagem é o facto de, com a câmara de vídeo, podermos inspecionarmos os dois lados (os dois canais inguinais). Havia muitas crianças que eram operadas a um lado por via aberta (ou via clássica) e, meses ou anos depois, apareciam novamente com hérnia do outro lado, o que obrigava a nova cirurgia. Com a laparoscopia, evitamos esta segunda cirurgia, em até 15% dos doentes. Para além da vantagem estética e de evitarmos segundas cirurgias, existem as outras duas vantagens clássicas associadas à laparoscopia: menos dor e menos complicações da ferida operatória (infecções, deiscências ou cicatrizes inestéticas). Por isso, estou seguro que, um dia, este tornar-se-á o tratamento padrão para todas as crianças.

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Um em cada 5 adolescentes tem varicocelo. Como?

O varicocelo é mais frequente do que os pais imaginam. Estima-se que 14-20% dos adolescentes e jovens adultos tenham varicocelo. Isto é, são 1 em cada 5 rapazes com veias dilatadas no escroto, mas, como tudo o que diz respeito aos órgãos genitais, em especial na adolescência, vive escondido e/ou é tabu.

Mas vamos por partes. O que é o varicocelo? A analogia que a maioria dos pais percebe é a de que se trata duma variz que aparece nas veias dos testículos, pois o varicocelo apresenta-se como umas veias dilatadas na raíz do escroto. Tal como nas varizes das pernas, estas veias dilatadas devem-se ao ‘refluxo’ do sangue venoso para trás. Nos casos mais graves, as veias são tão dilatadas que parecem um cacho de uvas (ou saco de vermes, para uma tradução literal duma imagem usada pelos ingleses). Nos casos mais ligeiros, as veias dilatadas aparecem só após um esforço físico (como a contração abdominal ou manobra de Valsalva). Logo, temos vários graus de varicocelos, conforme a tabela abaixo, e nem todos são para operar.

O varicocelo aparece quase sempre no testículo esquerdo, porque a veia espermática esquerda insere-se na veia renal esquerda quase na perpendicular, podendo, por isso, ‘refluir’ mais facilmente. Sabe-se hoje que o varicocelo provoca alterações estruturais no testículo e que pode ser causa de infertilidade.

Os consensos da ESPU (sociedade europeia de urologia pediátrica) apontam para que os varicocelos que causem dor/desconforto, que afetem os dois lados ou que provoquem uma diminuição do testículo afetado devem ser tratados, assim que o diagnóstico é confirmado. Pode e deve fazer-se uma ecografia escrotal, caso hajam dúvidas. A maioria dos autores defendem a cirurgia nos varicocelos de grau III, mesmo que assintomáticos.

Nos últimos anos o tratamento do varicocelo tem beneficiado da cirurgia minimamente invasiva e dos seus avanços. Com o aumento das capacidades técnicas dos cirurgiões pediátricos e dos equipamentos disponíveis para os mesmo, hoje a correção cirúrgica do varicocelo pode ser mais eficaz e com menos mobilidade para o doente. É aqui que entra o tal ‘azul de metileno’, que é um corante que marca os canais linfáticos. Antigamente, por laparoscopia, laqueávamos (‘fechávamos’) todo cordão espermático com os canais linfáticos incluídos. Isso fazia com que 15 a 30% dos doentes desenvolvessem hidrocelo, nos meses seguintes à cirurgia, por acumulação líquido linfático no escroto. Muitos destes doentes precisavam de fazer uma segunda cirurgia para corrigir este hidrocelo. (Ainda como interno de cirurgia publiquei um artigo sobre isso).

Esta é uma fotografia tirada numa das nossas cirurgias. Vêm-se bem os vasos linfáticos marcados e percebe-se quão pequenos são em comparação com as pinças com que trabalhamos.

Hoje em dia, com uma dissecção mais cuidada do cordão espermático e poupando alguns dos linfáticos (marcados de azul), conseguimos descer a percentagem de hidrocelos a zero. É a chamada varicocelectomia laparoscópica poupadora de linfáticos (em inglês, lymphatic-sparing laparoscopic varicocelectomy). Percebe-se assim melhor o impacto que tem o uso do azul de metileno durante a cirurgia e quantos adolescentes têm beneficiado dum tratamento ainda menos invasivo do seu varicocelo.

Nota final: Existem outros métodos para correção do varicocelo, nomeadamente por radiologia de intervenção (embolização) e por microcirurgia aberta. Não os abordo aqui, por achar que são inferiores à cirurgia laparoscópica poupadora dos linfáticos, embora este é ainda um tema em debate na comunidade médica.

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Prepúcio, fimose e circuncisão

Não há tema que suscite mais dúvidas entre as mães (e, embora muitos não admitam, entre os pais também) como a pilinha da criança. É um tema que ocupa muitas consultas de Cirurgia Pediátrica. Começa logo pelo prepúcio. Esta pelezinha que recobre o pénis dá pano para mangas (trocadilho intencional).

Uma das dúvidas que mais me colocam é se devem ou não retrair o prepúcio e até onde. Ao nascimento, o prepúcio está aderente à glande do pénis. Durante os primeiros meses, a produção de esmegma (espécie de gordura) faz com que a o prepúcio vá descolando lentamente. Mais tarde ou mais cedo, esta substância amarelada aparece na ponta da pilinha do menino ou fica visível à transparência junto à glande. Por vezes, é confundido com pús, mas não se trata de uma infecção nem exige outro tratamento que não seja lavar com água.

Como é que sabemos se o descolamento está completo? Noventa por cento dos meninos terão descolamento e retracção completa do prepúcio pelos 3 anos de idade. Por esta altura (ou quando o médico assitente indicar), durante ou logo após do banho, quando a pele está mais humedecida e laxa, os pais devem fazer uma retracção leve do prepúcio. Fazer até onde conseguirem sem nunca forçar. É frequente notar-se um aperto a toda a volta, o chamado anel prepucial. Forçar a passagem deste anel pode fazer sangrar esta pele, magoando o menino e levando a uma cicatriz (causa de fimose). Havia o hábito antigo (infelizmente não completamente abandonado) de forçar um descolamento na consulta. Na maioria das vezes, as criança deixava de confiar no médico que lhe tinha feito a maldade e nos pais que tinham sido coniventes, agarrando-o à marquesa, pelo que  pura e simplesmente não deixava ninguém tocar ‘no seu instrumento’, durante longos meses. Logo, o prepúcio voltava a aderir e, muitas vezes, desenvolvia a tal cicatriz (fimose cicatricial). Se a retracção for feita progressiva e diaramente, haverá uma altura em que a pele virá completamente para trás.

O que é a fimose? É a incapacidade de retracção do prepúcio, por impedimento do tal aperto prepucial. Pelo exposto acima, a fimose é normal (ou fisiológica) até aos 3 anos. Para além da cicatriz, existem outras causas (como a inflamação e infecção local) que podem fazer com o anel fique mais duro e difícil de ultrapassar. Nalguns casos, o tratamento com creme corticóide pode ajudar a alargar o anel. Nos casos cicatriciais, apenas a cirurgia resolverá o problema.

A circuncisão consiste no corte circular da pele do prepúcio de forma a tirar este ‘aperto’. É uma cirurgia sob anestesia geral e, na maioria dos casos, não necessita de pernoita no hospital. Regra geral, o desconforto da cirurgia é bem tolerado com paracetamol e/ou ibuprofeno associado a aplicação dum creme com antibiótico e anti-inflamatório corticóide localmente. Dependendo dos meninos, podem voltar à escola passados 3 dias e retomar o desporto passadas 3 semanas.

Quebrar o tabu. Numa sociedade em que a nudez e o sexo aparecem a cada passo na televisão e nas revistas, é estranho haver um grande tabu à volta do pénis dos miúdos e dos graúdos. A vergonha de falar do pénis pode ser particularmente complicada com a entrada na adolescência. Muitos pais referem que não controlam o que o menino já crescido faz no banho, pelo que deixam de saber se ele tem dificuldade ou não em retrair a pelezinha para trás. Por isso é importante quebrar o tabu e explicar os cuidados de higiene a ter com o seu prepúcio: puxar sempre para trás para urinar e lavar no banho. Uma forma discreta de monitorizar se a criança o faz correctamente é a inspecção das cuequinhas. Os vestígios de urina na cueca podem significar que o prepúcio não está a ser puxado durante a micção. Ela acumula atrás do prepúcio quando o menino faz xi-xi, caindo posteriormente para a cueca.

Depois, deixar as crianças sempre à vontade para falar de alguma dúvida que tenha, sinais de infecção, dor com a ereção, etc. A propósito deste último, é frequente alguns meninos terem uma fimose que só se manifesta por dificuldade em fazer a retração prepucial com o pénis erecto. Muitas vezes, apenas o freio (ou frenulum) peniano dificulta essa retração, pelo que pode ser necessária a circuncisão ou apenas uma plastia para libertar esse freio e alargar o anel fimótico.

fonte; yourwholebody.org

Circuncisão profilática? Têm aparecido vários estudos que demonstram eventuais benefícios da circuncisão profilática. Ela diminui o risco de transmissão de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), incuindo o VIH/SIDA, o herpes simplex, o papiloma vírus e a sífilis, particularmente em populações de riscco. Obviamente, a circuncisão por si só não previne as DSTs. A prevenção das DSTs faz-se contrariando os comportamentos de risco, entre eles o sexo desprotegido sem preservativo. Os benefícios para quem não começou uma vida sexual ativa são a dimunição das infecções urinárias (benefício muito ligeiro nas crianças) que nunca tiverem nenhuma infeçao urinária nem têm malformações urológicas) e prevenção das balanopostites (infecção da glande e do prepúcio) e da fimose.

Se estes benefícios suplantam os riscos e a dor inerentes a uma circuncisão é alvo de grande debate entre os cirurgiões pediátricos. Mais, existem várias religiões que preconizam a circuncisão logo ao nascimento (ou nos primeiros anos) e do outro lado grupos que entendem a circuncisão por razões religiosas ou culturais uma mutilzação desnecessária. Os estudos são escassos, mas o prepúcio tem uma enervação muito rica e é parte do orgão do prazer/erógeno masculino. Por isso, para quê mexer no que está a funcionar bem?

Polémicas à parte, as recomendações da Sociedade Europeia de Urologia Pediátrica indicam que a circuncisão deve ser feita apenas quando há indicação médica para tal e discutido caso-a-caso com os os pais (e com o adolescente, se já for mais velho). As infeções recorrentes (urinárias ou do prepúcio) podem ser indicação para circuncisão nos meninos sem fimose. Quanto à prevenção das DSTs, especialmente com a vacinação universal contra o papilomavirus instituída em Portugal, a circuncisão parece não fazer sentido.

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Abcesso perianal: sinais de alarme na mudança da fralda

Ao rever os temas médicos já abordados aqui no blogue, apercebi-me que tenho alguns temas em falta. Um deles, e que dá muitas dores de cabeça aos pais, principalmente de rapazes, é o abcesso perianal. Um bolinha vermelha muito dolorosa que surge na margem do ânus dos bebés. É uma doença bastante comum nos primeiros meses de vida. Estima-se que até 4,3% dos lactentes passem por um episódio destes. O abcesso perianal da criança deve-se a uma infecção de umas glândulas que temos no ânus (mais especificamente nas  criptas anais). Não se percebe ao certo porque é que algumas crianças têm mais tendência a fazer abcessos perianais que outros. Pode ter haver com uma maior profundidade das criptas anais ou algum excesso de androgéneos, o que justificaria o maior predomínio na população masculina. Não é um caso de falta de higiene dos pais, como já uma vez ouvi.

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[fonte: derival.com.br]

Ele aparece como um ponto vermelho, saliente e doloroso à volta do ânus. Os quatro sinais de alarme são os comuns das infecções: dor, rubor, calor e ‘tumor’ (aqui entendico como inchaço). Apesar de ser uma doença desconfortável para o bebé, o abcesso perianal pode ser controlado sem cirurgia. Se for detectado precocemente, pode ser controlado com antibiótico oral e/ou de aplicação local. Por vezes, principalmente se o início do tratamento for mais tardio, pode ser necessário antibioterapia endovenosa e drenagem cirúrgica do abcesso. Por isso, convém estar a atento na mudança da fralda por estes sinais: dor, rubor, tumefação.

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[fonte: springer.com]

A complicação mais frequente do abcesso perianal é a fístula perianal. Quando o abcesso  drenado cirurgicamente ou drena espontaneamente pela pele, cria-se um trajecto entre a tal cripta anal e a pele. Este trajecto pode ficar aberto durante meses e com saída de muco. Felizmente, e ao contrário do que acontece nos adultos, a fístula perianal do lactente tem tendência a fechar espontaneamente. Como se percebe, a fístula perianal da criança é muito diferente da fístula perianal do adulto ou do adolescente. Estes últimos existem um estudo diferente e que visa despistar a existência de uma obstipação ou doenças inflamatórias intestinais, como a Doença de Chron. No caso, das crianças, principalmente abaixo do ano de vida trata-se de uma situação benigna que resolve sem deixar sequelas.

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Porque vou vacinar os meus filhos contra a COVID-19

A DGS, depois de ouvir «um grupo de especialistas em Pediatria e Saúde Infantil, bem como de membros consultivos da Comissão Técnica da Vacina contra a COVID-19» recomendou a vacinação das crianças entre os 5 e os 11 anos. Lamento que algumas declarações de colegas médicos tenham criado dúvidas nos pais. A certa altura, como pai, fiquei na dúvida se deveria ou não vacinar os meus filhos. São dúvidas legítimas e que vou tentar esclarecer ponto a ponto, aproveitando para partilhar porque pretendo vacinar os meus filhos. 

Primeiro, a vacina é segura. Este ponto ninguém (credível, pelo menos) contestou. Os resultados dos ensaios clínicos estão públicos e disponíveis aqui e a monitorização feita pelas agências do medicamento europeia e americana não têm recebido alertas de reações adversas inesperadas. Tenho lido algumas preocupações desde o início da vacinação (antes de se falar da vacinação das crianças) sobre eventuais efeitos laterais a longo prazo. De facto, as vacinas de RNA são novas, mas não se especula atualmente que possam ser nocivas daqui a meses ou anos. Esta tecnologia foi investigada em vários laboratórios de diferentes países, os resultados são partilhados em reuniões e revistas científicas credíveis. Alguns efeitos laterais que têm aparecido são escrutinados publicamente e o risco-benefício de vacinar é monitorizado continuamente. Acreditar que existe uma conspiração planetária para encobrir resultados nocivos é não ter ideia como hoje se faz ciência.

Segundo, a vacina é eficaz na diminuição da transmissão entre as crianças e entre crianças-adultos. Outro ponto que ninguém (credível, uma vez mais) parece contestar. Isto é especialmente importante para quem vive ou convive com familiares, colegas da escola ou amigos com co-morbilidades em que a infeção por SARS-Cov-2 possa significar uma infecção grave ou mesmo a morte. Este sentido de pertença a uma comunidade que pretendemos proteger, para mim, bastaria como argumento a favor da vacinação, mas há mais.

Terceiro, a vacina é eficaz na diminuição da doença grave. De facto, até agora, a percentagem de doença grave na criança tem sido muito baixa. Em termos absolutos, muito poucas crianças precisaram de cuidados intensivos em Portugal (4 a 10, pelas fontes que ouvi na RTP1). Mas estes dados reportam a períodos em que poucas crianças eram infectadas, enquanto atualmente as principais vias de infecção ocorrem exatamente nesta faixa etária. À medida que forem crescendo o número de infectados, maior será o número de crianças que poderão precisar de internamentos hospitalares e cuidados intensivos. Pode até acontecer que a própria proporção de doentes graves versus doentes ligeiros aumente. Isto pode acontecer por uma alteração do próprio vírus (e não têm sido poucas), por haver mais crianças com mais comorbilidades do que imaginamos, e por mil e uma razões pelas quais esta pandemia insiste em atormentar a nossa vida. Nos adolescentes vacinados nota-se já uma diminuição significativa do número de miocardites desde a vacinação e tudo indica que venham a existir menos Síndromes Inflamatórios Multissistémicos. Nos adultos, as consequências a médio e longo prazo das infeções (mesmo das ligeiras) têm sido bastante inesperadas e, nalguns casos, bem incapacitantes. Pode vir a acontecer o mesmo nas crianças ou não, mas agora temos uma forma segura de prevenir.

Finalmente, o isolamento social a que temos sujeitado as nossas crianças é psicologicamente muito pior do que qualquer picada no braço. Nalguns casos, o isolamento escolar coloca-as em risco alimentar ou mesmo de integridade física. As consequências a longo prazo destes isolamentos consecutivos para o seu desenvolvimento são reais e já se fazem sentir. Sei que este isolamento não depende só da vacinação, mas ainda assim depende grande parte dela.

Estes são os meus argumentos. Longe de mim desrespeitar quem pensa ou pesa as suas decisões de forma diferente da minha. Como disse acima, as dúvidas são legítimas e as declarações de alguns médicos vieram aumentar a confusão. A decisão de vacinação é individual e livre. A obrigatoriedade da vacina já se discute noutros países europeus, mas isso é uma discussão ainda mais difícil.


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O megacólon que matou Elvis Presley?

Sempre pensei que Elvis Presley tivesse morrido de enfarte agudo miocárdio, disritmia cardíaca, overdose medicamentosa ou uma combinação dos anteriores. Sabia que a morte do Rei fora sempre envolta em muita controvérsia. Era conhecida a dependência que tinha de várias drogas, algumas delas prescritas pelo não menos controverso Dr. Nick Nichopoulos. O Dr. Nick era o médico pessoal de Elvis e ficou conhecido por prescrever todo o tipo de drogas a celebridades da época, entre eles o também cantor Jerry Lee Lewis. Já depois da morte de Elvis em 1977, o Dr. Nichopoulos foi suspenso pelo Tennessee Board of Medical Examiners exactamente pela sua prescrição ‘liberal’ de fármacos.

Voltando a Elvis, é possível que ele sofresse de obstipação crónica devido a Doença de Hirschsprung, também conhecido por megacólon congénito, uma doença que os cirurgiões pediátricos conhecem bem. Trata-se duma doença em que o cólon (intestino grosso) não consegue fazer a propulsão das fezes até ao ânus, fazendo com que ele fique preso/impactado a meio do trajecto, provocando obstipações graves que levam a uma dilatações enorme do cólon – o chamado megacólon. Na autópsia ao corpo de Elvis Presley, detectou-se um megacólon gigante e (claro) outras mazelas do consumo crónico de drogas.

A Doença de Hirschsprung deve-se a um mau desenvolvimento nervoso (ausência de células ganglionares autónomas) da parte final do intestino e afecta 1 em cada 5000 recém-nascidos. Pode ser mais ou menos grave, quanto maior (ou menor) for a porção do cólon distal afectar. Hoje em dia, a maior parte das crianças são diagnosticadas nos primeiros meses de vida, porque os casos de obstipação e distensão abdominal são investigados precocemente. Aliás, recém-nascido que não tenha uma dejeção nas primeiras 24 horas de vida deixa-nos logo de alerta. Se não tratada, a obstipação vai agravando, o cólon acumula fezes e dilata muito. Em casos mais graves, as fezes duras que acumulam no cólon podem ser ‘ultrapassadas’ por fezes líquidas que a criança não controla e perde para a cueca – um fenómeno chamado de soiling.

O tratamento da Doença de Hirschsprung é cirúrgico, pois temos que retirar a porção afectada e reconstruir o trajecto intestinal deixando o esficter anal intacto. O período de adaptação pós-operatório pode ser longo, mas passados 5 anos a maioria das crianças terão uma vida normal.

No seu livro de memórias de 2010, “The King and Dr. Nick: What Really Happened to Elvis and Me,” o médico de Elvis conta que durante a autópsia que o cólon de Elvis tinha o dobro do tamanho normal (“4-5 feet”) e que continha bário, um produto de contraste que Elvis tinha bebido vários meses antes durante um exame radiológico. Numa pessoa com trânsito intestinal normal, o bário bebido durante o exame demora 2-3 dias a ser expelido pelo ânus. Dr. Nick conta também que a obstipação de Elvis chegou ao ponto em que já não controlava a saída de fezes líquidas, o que provocava alguns embaraços nas actuações ao vivo (o tal soiling que falei anteriormente). 

Segundo Mary Roach, a Doença de Hirschsprung de Elvis justificaria a necessidade de estimulação rectal desde bebé. Ela entrevistou Dr. Dan Warlick, médico e investigador forense presente na casa de banho onde Elvis foi encontrado e este admite que a disritmia cardíaca que levou à morte do Rei pode ter sido provocada pelo esforço de defecação exuberante (manobra de Valsalva). Este é um fenómeno frequente em doentes encontrados inconscientes na casa de banho. 

As seta azul clara mostra a zona. Para baixo o cólon não células ganglionares. Para cima temos um cólon dilatado (megacólon) pela acumulação de fezes.
fonte: radiologyspirit.blogspot.com

Quando temos suspeita de de Doença de Hirschsprung (megacólon congénito) fazemos um Rx abdominal com ou sem contraste, que nos dá imagens muito típicas. Ainda assim, o diagnóstico definitivo é feito por biópsia rectal, onde se confirmam as tais alterações nervosas que descrevi acima. Dr. Dan lembra-se do megacólon, mas como a hipótese de se tratar de Doença de Hirschsprung foi aventada apenas muitos anos mais tarde, nunca se realizou a análise histológica (biópsia) da peça que confirmaria/ou negaria este diagnóstico. Ficará para sempre a dúvida.


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A Doença Inflamatória Intestinal na Criança – o que é importante saber?

A Doença Inflamatória Intestinal (DII) foi um dos temas que discutimos no primeiro workshop online de Cirurgia Pediátrica da SPCMIN – Sociedade Portuguesa de Cirurgia Minimamente Invasiva. Os doentes com Crohn e com colite ulcerosa têm beneficiado dos avanços da cirurgia endoscópica (laparoscópica e robótica) e de outras técnicas minimamente invasivas. Estas doenças continuam a crescer em número de diagnósticos e a aparecer em crianças e adolescentes mais jovens. Como nunca abordei este tópico no blogue, achei que seria uma boa altura. 

A DII comporta um conjunto de doenças auto-imunes do intestino: Doença de Crohn (DC), Colite Ulcerosa (CU) e a colite indeterminada. A DC é uma inflamação que afeta apenas porções separadas do tubo digestivo, mas que pode afetá-lo em toda a sua extensão (da boca ao ânus).  A CU está limitada ao cólon e ao reto e geralmente começa de baixo para cima (isto é inicia-se no recto e estende-se proximalmente). A colite indeterminada é um estado inflamatório do cólon inespecífico que mais tarde pode vir a diferenciar-se em DC ou CU.

fonte: quibd.com

Estima-se que afecte 0,3% da população portuguesa e existe um aumento crescente na população pediátrica. Pensa-se que existam factores ambienciais que estejam a contribuir para esse aumento, nomeadamente a utilização excessiva de antibióticos. As DII têm uma causa pouco conhecida e acredita-se que vários fatores possam contribuir para este estado inflamatório. No fundo, sabemos que há indivíduos mais susceptíveis que, com o estímulo correto, desencadeiam a sua DII. Muito se tem especulado sobre o impacto de certos alimentos no aparecimento das DII, mas hoje sabemos que não há nenhum alimento ou classe de alimentos que provoquem DC ou CU. Não são doenças alérgicas. Logo, a inflamação no intestino é auto-infligida e não provocada pela dieta. Obviamente que, um doente com o intestino inflamado, pode ter mais dificuldade na digestão/absorção de certos alimentos, e esses alimentos até podem variar consoante a progressão da DII. Existe, sim, influência do estado psicológico dos doentes. Um doente com bom apoio emocional terá menos crises.

As DII têm apresentações semelhantes. Geralmente, a criança/adolescente apresenta uma dor abdominal tipo cólica ou moedeira e diarreia (podendo ter sangue ou pús visível) que dura vários dias. Na DC, apesar de haver diarréia na maioria das vezes, o primeiro sintoma costuma ser a perda de peso. Ainda na DC, como esta afeta todo o tubo digestivo, podem aparecer úlceras desde a boca até ao ânus e até a presença de abcessos e fístulas perianais. A zona mais afectada é o íleo terminal (porção final do intestino delgado), pelo que uma primeira crise pode ser confundida por apendicite aguda. Existem outras formas de apresentação mais raras da DII, como dores articulares, alterações cutâneas ou anemia. 

Existem alguns marcadores sorológicos (“análises de sangue”) que nos podem apontar para DII, mas o diagnóstico definitivo é feito por endoscopia (alta e baixa) com biópsia. O aspecto e a histologia (biópsia) da DC e da CU são distintas e permitem confirmar o diagnóstico diferencial. 

O tratamento inicial das DII é muito semelhante. Para controlar a inflamação será necessária uma combinação de antibióticos, glucocorticóides, imunossupressores e anti-corpos/biológicos. Mas, a DC e a CU têm “percursos de vida” muito diferentes. A CU é limitada ao cólon-recto e à camada mucosa; enquanto a DC pode afectar vários segmentos e afecta toda a espessura do tubo digestivo (da mucosa à muscular própria). Mais, a CU tem um risco aumentado de desenvolvimento de carcinoma. Este risco é pequeno nos primeiros 10 anos de doença (3%), mas depois o risco aumenta mais 20% a cada 10 anos. O doentes com CU necessitarão (mais tarde ou mais cedo) de uma cirurgia para remoção de todo o cólon e mucosa rectal. A idade e o tipo de cirurgia têm que ser discutidos caso a caso. 

na DC, a cirurgia é evitada ao máximo. Felizmente, a grande maioria dos doentes respondem bem ao tratamento médico, permitindo aos doentes viverem anos em remissão (assintomáticos). A cirurgia é necessária para tratar complicações – estenoses (apertos), abcessos, fissuras e fístulas – e deve ser sempre o mais conservadora possível. 

Tratando-se duma doença crónica é normal haver muita informação e desinformação na Internet. Por isso, gosto deixar fontes fidedignas onde os leitores podem obter dados cientificamente correctas e onde podem eventualmente esclarecer as vossas dúvidas:

  • APDI – Associação Portuguesa da Doença Inflamatória do Intestino, Colite Ulcerosa e Doença de Crohn (APDI)
  • GEDII – Grupo de Estudos da Doença Inflamatória Intestinal.

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O que sabem os pais de laparoscopia?

Há uns meses, fizemos circular nas redes sociais um inquérito para a perceber o que os pais sabiam (ou não sabiam) sobre a laparoscopia. O tema é relevante, porque os médicos precisam de adaptar a mensagem aos que os pais já sabem.  No caso específico, interessa aos cirurgiões pediátricos que precisam de explicar o procedimento a ser realizado ou discutir com os pais as diferentes opções de abordagem. É importante percebermos a quantidade e qualidade da informação que os pais já têm.

O número de respostas foi surpreendente. Numa semana apenas, conseguimos 1724 respostas. Em 83,7% dos casos foram as mães a responder. 91% dos respondentes tinham um curso superior ou mais. Mas, apesar desta amostra tão literada, 31,5% responderam que não tinham qualquer conhecimento sobre laparoscopia.*

Dra. Catarina Carvalho a apresentar o trabalho ‘What do parents know about laparoscopy?’ ESPES, Vicenza.

Os restantes 78,5% sabiam o que era laparoscopia: 43,9% por já terem sido submetidos ou alguém conhecido ter sido submetido a cirurgia laparoscópica 12,6% por já terem lido sobre laparoscopia na internet. Este mesmo grupo ‘de conhecedores’ atribuia a recuperação mais rápida (72%) e as cicatrizes mais estéticas (12,7%) como principais vantagens da laparoscopia. As preocupações em relação à  laparoscopia, prendiam-se com a complexidade técnica (45%) e maior tempo de cirurgia (5,8%). Um outro dado acessório (mas não menos interessante) é que 102 pais da nossa amostra tinham um filho (ou mais) já operado por laparoscopia. Nestes a mediana de satisfação com a laparoscopia era 5/5.

Visão geral duma correcção de hérnia inguinal por laparoscopia.

Estes são os resultados preliminares que apresentámos e discutimos no Congresso Anual da European Society of Pediatric Endoscopic Surgeons, que decorreu na semana passada em Vicenza. Em seu tempo, serão vertidos num artigo científico que estamos a preparar para publicação. A todos os respondentes, fica aqui o nosso sincero agradecimento. 

* Se faz parte destes 31,5%, sugiro-lhe começar por estes artigos aqui do blogue: correcção de hérnia inguinal sem cicatriz na criança; hérnia epigástrica sem cicatriz; o fantasma do apêndice parte 3). Depois, se lhe despertar o interesse, percorra os temas médicos que mais lhe interessar.

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Muitos meninos têm hidrocelo mas nem todos são para operar

Em tantos anos de blogue, as únicas referências ao hidrocelo aconteceram como notas de rodapé dos textos dedicados às hérnia inguinais. No entanto, o hidrocelo é uma patologia que afecta grande parte dos rapazes ao nascimento (60-80% nalguns artigos), pelo que merece um artigo autónomo. Ainda por cima, o hidrocelo tem um segundo pico de incidência na adolescência, uma altura que os rapazes já não mostram os genitais aos pais e muitos médicos se coíbem de os examinar. É preciso estar atento.

O hidrocelo é uma acumulação de líquido no escroto. Pode ser uma reação temporária a um traumatismo ou a uma inflamação do testículo (ou um dos seus anexos).  Nos recém-nascidos e pequenos lactentes, o líquido acumulado vem de dentro da barriga através duma comunicação desta com o escroto (hidrocelo comunicante). Como expliquei num texto anterior, o canal peritônio-vaginal (ou processo vaginal) é uma comunicação une a cavidade abdominal com o saco escrotal. É o canal por onde desce o testículo que nasce dentro da barriguina dos fetos, mas tem que descer até ao escroto durante o primeiro ano de vida.  Este canal pode demorar vários anos a fechar completamente. 

fonte: childrenshospital.org

Tipicamente, no hidrocelo comunicante, o escroto tem mais líquido ao final do dia (porque foi acumulando) e está menor quando a criança acorda de manhã (porque recolheu para a cavidade abdominal enquanto este deitada). Não há um consenso de até que idade podemos esperar que feche. Há quem coloque indicação operatória aos 2 anos, mas se houver noção que está a melhorar, pode-se esperar mais tempo. Por outro lado, se houver suspeita de haver uma hérnia associada, deve operar-se mais precocemente. Isto é, se a persistência do canal permitir passar intestino ou gordura intraperitoneal chama-se hérnia e tem perigo de encarcerar.

Aspecto pós-operatório de correcção laparoscópica (sem cicatriz) de hidrocelo comunicante… direita? esquerda?

Já o hidrocelo do adolescente não costuma ser do tipo comunicante. Daí, não haver variação do volume do escroto ao longo do dia. Nestes casos uma das túnicas que recobre o testículo produz líquido a mais e o escroto começa a aumentar de volume e a ficar com tensão. Na maioria das vezes, não se sabe o porquê desta hiperprodução. O risco de infecção ou malignidade é pequeno, mas este líquido acumulado causa desconforto e dificulta a palpação do testículo. Se for de pequeno volume ou com pouco tempo de evolução, é normal que o cirurgião lhe peça para aguardar. Nalguns casos, pode ter havido uma inflamação ou um traumatismo do testículo ou dos seus componente que tenha despoletado um hidrocelo temporário. Se não houver melhoria, o mais sensato é operar. 

fonte: pedline.org.br

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